Por Wanderlei Passarella - Diretor Executivo na Synchron & Celint
Conversa com Patrick Simon - Presidente do Conselho de Administração do Grupo S2
Neste artigo, Patrick Simon, Presidente do Conselho de Administração do Grupo S2 (Redley, Cantão, Kenner e Bisi) fala à Synchron sobre sua experiência em instalar um Conselho de Administração e dá dicas para os empresários que estejam pensando em fazê-lo.
1. O que faz o Grupo S2 e quais são os seus caminhos futuros?
O S2 é um Grupo Empresarial de desenvolvimento de produtos de alto valor agregado no segmento de calçados e vestuário. É proprietário das marcas e da rede de lojas Cantão, Redley, Bisi e Kenner.
Nós somos verticalizados nas partes do processo de trazer produtos a mercado que agregam ao valor percebido pelo cliente. No vestuário, isso significa o desenvolvimento de produto, “branding” e parte da distribuição via lojas (monomarca).
Recentemente, internalizamos até partes do processo de industrialização de roupas que não agregam ao valor percebido, mas nos trazem vantagens tributárias.
Em calçados, focamo-nos na parte de desenvolvimento e fabricação. Vendemos menos de 10% do volume em lojas próprias. Conseguimos ter assimetrias competitivas no design e em algumas tecnologias na fabricação de placas de borracha sintética.
Há anos temos seguido um modelo “asset-light”, focando em geração de caixa livre. Isso, de certa forma, tem formado parte da nossa estratégia. Desde 2009, quando parei de trabalhar no mercado financeiro americano para focar nos negócios da família, eu decidi me empenhar para termos um balanço forte, por influência de Warren Buffet, a quem admiro. Outro driver na definição da estratégia é a lei tributária brasileira. Como já mencionei, nos posicionamos na industrialização de roupas, o que não teríamos feito se não fosse pelo incentivo fiscal. Claro que todos estes conceitos precisam ser revisitados no futuro.
É um desafio continuo não só lidar com as forças normais de mercado, mas também com as dificuldades criadas pelo governo. O único consolo é que, em teoria, nossos competidores também tem que lidar com os mesmos desafios impostos pelos órgãos públicos. O desafio é maior para os players menores que são obrigados a ter uma estrutura pesada (em relação a seus faturamentos) de contabilidade e estrutura de pessoal para cumprir com todas as regras burocráticas impostas ao segmento.
2. Por que os acionistas controladores decidiram implantar uma Governança Corporativa, com Conselheiros Independentes?
Com uma carreira que começou como analista de investimentos nos Estados Unidos e uma formação que inclui um CFA, não poderia imaginar uma estrutura de governança diferente para a S2. O que eu não imaginava era o quanto ter um sistema de governança corporativa com conselheiros independentes ajudaria o meu relacionamento com meu sócio, no caso meu irmão mais velho. Ter profissionais, que nós dois respeitamos, tendo o mesmo poder de voto nas decisões mais importantes da companhia traz uma tranquilidade enorme. Quando nós dois temos opiniões diferentes, é muito mais fácil não levar para o lado pessoal se temos profissionais independentes pesando de um ou de outro lado. Há uma natural preservação da relação familiar.
Outro fato positivo, e fundamental, é a mudança de atitude dos donos da empresa. Acredito que é muito mais saudável para uma empresa ter um CEO que não age com as idiossincrasias de dono da empresa, mesmo se for dono de 100% das cotas ou ações. Um CEO tem que seguir as mesmas regras que os outros funcionários e ter um Conselho acima dele ou dela que cobra resultados e ajuda na formulação de estratégias. E, além disso, toda a empresa sente o peso das decisões tomadas pelo Conselho, reage positivamente a elas e atende as demandas de forma muito mais profissional.
Também tenho a bagagem de ter passado pela era das DOT-COM no começo do século e depois toda a resultante avalanche de regulamentos que foi a Lei Sarbanes-Oxley. Vi o quanto pobre era a governança corporativa nas empresas de capital aberto americanas. E, mesmo após toda aquela legislação, ainda acredito que se não houver boas intenções no topo, um Conselho com membros independentes não garante boa governança.
O ponto fundamental para um Conselheiro é entender a sua responsabilidade fiduciária. Tem que tratar do patrimônio da empresa a um nível até mais alto do que trataria dos seus próprios ativos. Como portfolio manager de um trust department, onde investia o capital de outros, vigiado sempre por juízes e beneficiários, aprendi o quanto séria é essa relação.
3. Como tem sido essa experiência?
Essa experiência tem sido fantástica! Ter um “reservatório” de experiências e bom senso disponível para a empresa na hora de se tomar as decisões mais importantes é um tremendo avanço para a S2. Conselheiros com experiências diferentes, em ramos de atividade distintos, com idades diversificadas e personalidades diversas contribuem muito para a riqueza do Grupo. Fica fácil para a família compreender que as decisões agora estão mais gabaritadas. Além disso, meu trabalho como Chairman se tornou mais fácil, porque quando tínhamos um Conselho Consultivo, a empresa não sentia o mesmo nível de pressão. Hoje percebo que as demandas do Conselho de Administração são levadas mais a sério. Meu CEO está vigilante para não tomar decisões que talvez caibam ao Conselho tomar.
4. O que você aconselha às empresas familiares de capital fechado que estão pensando sobre Governança Corporativa?
Primeiro de tudo a família tem que entender que não é porque alguém tem o mesmo sobrenome que o fundador, que automaticamente deveria ter um cargo, alto ou baixo, na empresa. O segundo ponto crítico é que dividendos e salários são coisas completamente diferentes. Salários devem ser determinados puramente de forma meritocrática, alinhados com o mercado preferivelmente por consultores especializados. Dividendos, por outro lado, são distribuídos conforme os lucros e de acordo com a participação acionária na empresa.
Se a família entender que dividendos devem ser a fonte de geração de riqueza para a família, e não os salários, então uma estrutura de Governança com um Conselho de Administração que inclui, na maioria, Conselheiros Independentes é o claro caminho do sucesso. O foco no sucesso do negócio passa a ser muito grande. Há uma chance maior de a empresa ultrapassar gerações.
5. Quais são as fases que devem ser observadas para se instalar um Conselho de Administração em uma empresa familiar?
A primeira fase é um alinhamento familiar para os conceitos mencionados acima. A separação entre família e empresa, entre salários e dividendos. Isso precisa estar bem firme.
Em segundo lugar, não é necessário que exista uma regra do tipo “ninguém da família pode trabalhar aqui”, ou vice-versa; cada caso é diferente e precisa ser analisado. Li um estudo no “The Journal of Finance” mostrando que empresas familiares tinham um retorno maior que as empresas não familiares. Ter uma família ligada à empresa pode ser um ponto positivo. Por outro lado, facilmente pode se tornar um ponto negativo se a família não compreender a questão dos salários e dividendos.
E, por último, é preciso um bom nível de intervenção de fora, consultores para ajudarem na consecução dos sistemas de gestão e das estruturas profissionais.
6. Qual é o momento ideal para se iniciar uma Governança Corporativa Independente?
O quanto antes melhor. Basicamente, o momento certo é quando a empresa puder ter recursos para remunerar os Conselheiros, o que pode acontecer muito cedo na trajetória de vida da organização. Eu vejo claros benefícios nessa atitude. No meu caso, tenho outro negócio particular aqui nos Estados Unidos, onde moro, uma locadora de motocicletas e gostaria muito de iniciar um Conselho. Seria ótimo de ter o input de outros profissionais, da área de marketing e de outras áreas também. Seria muito valioso. Já penso sobre isso!